terça-feira, 12 de maio de 2015

Vai uma bebida para relaxar? Especialista explica que mal há nisso


Pesquisas recentes conduzidas pela ISMA-BR (International Stress Management Association no Brasil) já confirmaram: a maioria das pessoas que se sentem em níveis altos de stress ingerem maior quantidade de bebida alcoólica como tentativa de relaxar. O que poucos sabem -- ou diminuem a importância da informação que têm -- é que o consumo de bebida alcoólica, de medicamentos e outras drogas pode levar a um caminho sem volta. A dependência química é uma doença que não escolhe faixa etária, nem poder aquisitivo, possui tratamento longo e caro, e não tem cura. Traz graves reflexos para vida pessoal e profissional, além de impactos não menos graves nos círculos familiares. 

Na entrevista abaixo, o Dr. Sergio de Paula Ramos, psiquiatra, psicanalista, doutor em medicina e especialista em dependência química, analisa a relação do álcool e medicamentos com o stress, fala dos perigos da substituição de atividades saudáveis pelo uso perigoso de drogas lícitas ou não. Dr. Sergio é um dos palestrantes do 15º Congresso de Stress da ISMA-BR, e participará do "Talk Show: Sociedade anônima ou sociedade humana?" junto de Evangelia Demerouti, presidente do Human Performance Management Group e professora de comportamento organizacional da Eindhoven University of Technology; e de Michael P. Leiter, diretor do Center for Organizational Research and Development e titular da cátedra de pesquisa canadense em saúde e bem-estar ocupacional na Acadia University, onde também é professor de psicologia.


ISMA-BR: Dr. Sérgio, qual é a relação do stress com bebida e outras drogas?
Dr. Sergio de Paula Ramos: As chamadas drogas de abuso têm em comum o fato de alterarem o funcionamento cerebral. Nos primeiros usos, a pessoas sente uma sensação de melhoria. Se é um paciente deprimido, vai se sentir menos deprimido. Se é estressado, vai se sentir mais calmo. Tudo isso dependendo da droga usada. Pessoas mais estressadas, ou que estão em trabalhos mais estressantes, são mais suscetíveis ao consumo de drogas. No caso do alcoolismo, profissões como as dos médicos, vendedores, policiais, bombeiros, coveiros, profissionais que ficam mais no front, são mais propensos a vir a desenvolver uma dependência do álcool, uma vez expostos a ele. Eu considero uma forma complicada de lidar com o stress fazer uso de álcool, calmantes e outras drogas. Geralmente, essas pessoas começam a usar, vão usando, vão se aliviando e, quando abrem os olhos, já estão dependentes.

ISMA-BR: Quais os fatores de risco para alguém desenvolver uma dependência?
Dr. Sergio: Vai depender do tipo de droga, da genética do usuário, da existência ou não de outra doença psiquiátrica; todos esses são fatores de vulnerabilidade, fraquezas em cima das quais as drogas tomam conta. Existem muitas atividades saudáveis para administrar o stress: a prática de atividades físicas, de esportes, de algum lazer, a manutenção de vínculos familiares e sociais, de um hobby. Mas se, em vez de tudo isso, o indivíduo, para relaxar, precisa beber porque teve um dia muito agitado, precisa de seu whisky quando chega em casa, esta pessoa está se utilizando de maneiras patológicas de lidar com o stress.

ISMA-BR: Quais os impactos da bebida e outras drogas neste caso? 
Dr. Sergio: Na medida em que estas drogas vão entrando na vida de alguém, as repercussões vão aparecendo. Alguns terão reflexos num nivel físico, vão ter problemas clínicos. Outros, na convivência familiar e social e outros, ainda, no exercício profissional. O que acontece é que na maioria dos casos de dependência, o dependente não se julga ser um. Na ótica destas pessoas, elas não precisam nem parar nem diminuir o consumo. Aí os problemas vão aumentando e quem está próximo vai sentindo os efeitos desta doença, e transformando-se nas vítimas. E como a família é sempre quem está mais próxima, a esposa e os filhos, ou seja o familiar que for, sentirão as consequências mesmo antes de o paciente aceitá-las.

ISMA-BR: E o conteúdo publicitário não é um vilão nestes aspectos?
Dr. Sergio: Como no Brasil nós deixamos que os próprios produtores de bebida alcoólica regessem o código de publicidade, nós pedimos que a raposa tomasse conta do galinheiro. A propaganda da indústria do álcool no Brasil talvez seja a mais perversa do mundo porque, sistematicamente, associa o álcool ao consumo precoce, ao divertimento, ao sucesso com o sexo oposto. Tudo o que o álcool não faz. Shakespeare já dizia: "o álcool desperta o espírito, pena que adormece o corpo". Álcool traz impotência sexual e acidente de trânsito, e a propaganda vai exatamente no sentido inverso.

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